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B


 B. A M issão dos D oze , 10.1-42

1. A Nomeação (10.1-4) Jesus escolheu doze discípulos (1) para que empreendessem uma viagem

missionária pelas doze tribos de Israel. As fronteiras dessas tribos já não estavam intactas, mas havia representantes de todas estas tribos no meio do povo que ficou na terra, assim como no meio daqueles que retornaram do cativeiro. A missão dos doze era estritamente voltada às “ovelhas perdidas da casa de Israel” (6). Aos seus mensageiros, Jesus deu “autoridade” - a palavra grega é exousia - sobre

os espíritos imundos. Uma importante parte do ministério dos discípulos, como do próprio Senhor, consistia em expulsar demônios, e curar os enfermos. A expressão espíritos imundos aparece duas vezes em Mateus, dez vezes em Marcos, e cinco em Lucas (além de “espírito de um demônio imundo”, 4.33), duas vezes no livro de Atos e uma vez no Apocalipse (16.13). Ela parece ser uma designação particularmente apropriada para “demônios”. Essa última palavra, daimonia, é encontrada onze vezes em Mateus, treze em Marcos, vinte e duas vezes em Lucas e seis vezes em João de um total de sessenta vezes no Novo Testamento. Lucas também os chama de “espíritos maus” ou “espíritos malignos” (Lc 7.21; 8.2; At 19.12-13,15-16). Os doze discípulos são chamados de apóstolos (2). A palavra vem do grego apostolos,

que quer dizer “alguém enviado em uma missão”. Walls observa que “A força do termo apostolos é provavelmente a de ‘alguém comissionado’ - e está implícito que se trata de alguém comissionado por Cristo”.3 Listas dos doze apóstolos podem ser encontradas em todos os Evangelhos

Sinóticos (cf. Mc 3.16-19; Lc 6.14-16) e em Atos 1.13. Todas as listas começam com Pedro e terminam com Judas Iscariotes (exceto a última, que foi preparada quando Judas já estava morto). Os quatro pescadores sempre são citados em primeiro lugar, embora em seqüências diferentes. Mateus e Lucas os mencionam como pares de irmãos. Marcos e Atos mencionam Pedro, Tiago e João em primeiro lugar, como constituindo o círculo mais íntimo, um grupo privilegiado que esteve a sós com Jesus na ocasião da ressurreição da filha de Jairo, no Monte da Transfiguração e no Getsêmani. Além disso, o segundo grupo de quatro nomes sempre começa com Filipe, e o terceiro grupo com Tiago, o filho de Alfeu. As pequenas diferenças podem ser vistas na comparação das listas.4

Simão “é um nome grego comum substituto do hebraico Symeon” (cf. Atos 15.14).'"

Pedro é o grego petros (“pedra”). Ele é designado como sendo o primeiro. Tasker diz: “Há pouca dúvida de que o primeiro (protos) signifique ‘o primeiro e o principal’ ”? André e Filipe são nomes gregos. Bartolomeu, Tomé (“gêmeo”) e Mateus são nomes aramaicos. Aquele que foi apelidado como Lebeu talvez deva ser omitido, por não ser encontrado nos dois manuscritos gregos mais antigos (cf. as versões revisadas). Marcos apresenta simplesmente Tadeu. Em lugar desse nome, Lucas usa “Judas, filho [ou irmão] de Tiago” (Lc 6.16; At 1.13). Tasker observa: “Pode ser que Judas fosse o seu nome verdadeiro; porém, mais tarde, devido ao estigma ligado ao nome Judas Iscariotes, Tadeu (que talvez signifique “de coração bondoso”) tenha sido um nome que substituiu o nome Judas”.7 Simão, o Zelote (4), esta última palavra deve ser entendida como simplesmente

designando-o como um judeu que era zeloso pela lei (como Saulo) ou um homem que foi, anteriormente, um membro do grupo revolucionário que se tornou conhecido como “os zelotes”.8 Iscariotes normalmente se explica como um “homem (hebr. ish) de Queriote” - um vilarejo de Judá. Se isso estiver correto, Judas era, aparentemente, o único dos doze que não era da Galiléia.

2. Instruções (10.5-15)9 A primeira instrução que o Mestre deu aos seus doze apóstolos (somente no texto de

Mateus) foi a de não evangelizar as gentes (ou “os gentios”) nem os samaritanos (5). Depois do Pentecostes isso seria feito, como está registrado no livro de Atos. Mas antes da sua crucificação, Jesus estava preocupado em oferecer o Reino a Israel. Paulo declarou que o evangelho de Cristo é “o poder de Deus para salvação de todo aquele que crê, primeiro do judeu e também do grego” (Rm 1.16). As ovelhas perdidas da casa de Israel (6) devem ser as primeiras a ter a oportunidade de aceitar o seu Messias. A mensagem que eles deviam pregar (proclamar) era: E chegado o Reino dos

céus (7). Esta era a mensagem de Jesus e de João Batista. Juntamente com a sua pregação, eles deviam desempenhar um ministério de cura dos

enfermos e de expulsão dos demônios (8). A ordem, ressuscitai os mortos (encontrada somente no texto de Mateus) apresenta um problema. Adam Clarke a rejeita como improvável.10 Stier diz: “Nós a consideramos uma importação espúria de uma época futura... à fraca fé deles não se poderia confiar esse poder tão grande”.11 Mas estas palavras são encontradas na maioria dos primeiros manuscritos gregos. A. B. Bruce afirma: “Está... demasiadamente autenticada para ser omitida”, e acrescenta: “Ou ela encontrou um lugar no manuscrito, ou deve ter se infiltrado como um comentário em um período muito curto”.12 O problema é que os Evangelhos registram somente três vezes em que Jesus ressuscitou os mortos. Alguns pensam que é difícil imaginar os doze apóstolos fazendo isso. Mas o Mestre delegou sua autoridade aos seus apóstolos, e esse poder estava potencialmente incluído. Nos Evangelhos não há registro de que eles realmente tenham ressuscitado os mortos, embora Pedro posteriormente tenha ressuscitado Dorcas (At 9.36-43). A seguir vêm as instruções específicas em resposta à pergunta que não foi feita: “O

que devemos levar conosco?” A ordem foi: Não possuais ouro, nem prata, nem cobre, em vossos cintos (9). Estas eram as três modalidades de dinheiro. O ouro tinha o lugar do nosso atual papel-moeda. Cintos literalmente significa os cintos de dinheiro o lugar mais seguro para se transportar dinheiro.

Os alforjes (10) também estavam proibidos. O termo pera, em grego, era a palavra

usada para a bolsa de couro de um viajante. Mas com base em uma inscrição deste período na Síria, Deissmann afirma: “Este termo claramente significa a bolsa em que os mendigos guardavam as esmolas que recebiam”.13 Assim, a orientação de Cristo significa duas coisas: “Não haverá pagamento, e nem mendicância”.14 Eles não poderiam ter duas túnicas. A palavra grega se refere à roupa íntima. Assim, “camisas” (Moffatt) seria uma boa tradução. Sandálias quer dizer literalmente “atado embaixo”. Eles deveriam usar sandálias, mas não poderiam levar um par extra

(cf. Mc 6.9). Bordão está no singular nos manuscritos antigos - “nem um bordão”. Evidentemente algum copista posterior passou o termo para o plural, porque parecia estar em conflito com o texto de Marcos - “senão um bordão”. Mas Mateus diz que eles não deveriam possuir ou “conseguir” um bordão; isto é, um bordão extra. Eles deveriam simplesmente levar o que tinham, e sair para a sua missão. A razão para essas instruções rigorosas é óbvia. Os discípulos fariam uma viagem

urgente e de curta duração. O clima era quente e os costumes da época lhes garantiam comida e alojamento grátis onde quer que estivessem. Assim, eles não precisavam se sobrecarregar com bagagens. Eles deveriam escolher cuidadosamente os seus alojamentos em cada cidade, e permanecer na mesma casa enquanto estivessem ali (11). Ao entrar em uma casa a instrução era saudai-a (12). A saudação costumeira era “Shalom”, a palavra hebraica que significa “paz!” Quando rejeitados, deveriam sacudir dos pés a poeira do lugar (14) como um sinal de

que Deus, por sua vez, rejeitava aquela casa ou cidade porque ela havia rejeitado a sua mensagem. Jesus declarou que haverá menos rigor para... Sodoma e Gomorra do que para aquela cidade (15). Muita coisa foi dita nos últimos anos sobre “os bondosos ensinos do humilde galileu”. Mas em diversas ocasiões Jesus falou com voz severa sobre a realidade de um julgamento futuro. A destruição de Sodoma é mencionada diversas vezes no Novo Testamento como um exemplo de advertência (cf. 11.23-24; Lc 10.12; 17.29; Rm 9.29; 2 Pe 2.6; Jd 7). Na verdade, em determinada ocasião Jerusalém chegou a ser chamada de “Sodoma” (Ap 11.8).

3.Advertências (10.16-23) Jesus advertiu os seus discípulos quanto às perseguições que os surpreenderiam.

Esta predição não fala apenas da viagem imediata que eles estavam fazendo, mas também dos muitos anos de ministério que estavam por vir. Eles estavam saindo como ovelhas ao meio de lobos (16). O Livro de Atos fornece uma documentação vívida desta afirmação. Os missionários deveriam ser prudentes como as serpentes, mas símplices

como as pombas. O primeiro adjetivo significa “cauteloso”, o segundo “inofensivo” ou “sincero”. Um cristão bem-sucedido precisa ter essas duas características. O Mestre preveniu os seus discípulos de que eles seriam entregues aos sinédrios

(conselhos) e açoitados nas sinagogas (17). Eles também (18) seriam conduzidos à presença dos governadores (como Félix e Festo, Atos 24 e 25) e dos reis (como Agripa, Atos 26). Esses eram governadores gentios. Mas foram os judeus que causaram a prisão de Paulo. Assim, a perseguição ainda era judaica, em sua origem.

Quando entregues, eles não deveriam ficar ansiosos por sua defesa (19), pois o Espírito Santo lhes daria as palavras que deveriam dizer (20). Cristo também declarou que a vinda do seu reino resultaria na divisão das famílias,

de modo que os filhos poderiam causar a morte dos pais (21). Isto já aconteceu muitas vezes no passado e ainda hoje acontece, especialmente nos países muçulmanos. Com o aviso de que eles seriam odiados por todos os homens, por causa de Jesus, vem a promessa: mas aquele que perseverar até ao fim será salvo (22). Há um significado segundo o qual alguém é salvo quando se converte, outro em que alguém está sendo salvo dia após dia à medida que crê e obedece, e ainda outro segundo o qual a pessoa será salva no céu, finalmente e para sempre. E do segundo e do terceiro significados que Jesus fala neste versículo. Se fossem perseguidos em uma cidade, os missionários deveriam ir para outra (23).

Jesus os informou de que não acabariam de percorrer as cidades de Israel sem que viesse o Filho do Homem. Muita tinta foi usada na tentativa de explicar o significado dessa afirmação. Talvez a melhor interpretação possível seja a de Tasker: “Este versículo muito difícil, que só é encontrado no texto de Mateus, é melhor compreendido como uma referência à vinda do Filho do Homem em triunfo, imediatamente após a sua ressurreição, quando Ele apareceu aos apóstolos e os encarregou de fazer discípulos em todas as nações (28.18-20)”.15

4. O Discipulado (10.24-25) Os apóstolos não poderiam esperar escapar à perseguição, pois não é o discípulo

mais do que o mestre (24) - literalmente, “professor”. (Discípulo significa “aprendiz”). Nem é o servo (grego, “escravo”) mais do que o seu senhor (amo). Se eles chamaram Belzebu16 ao “pai de família” (uma única palavra em grego), quanto mais aos seus domésticos (25)? A origem e o significado de Belzebu ainda estão velados na obscuridade. As recentes descobertas em Ugarit sugeriram “príncipe de BaaP. Outras sugestões são “Senhor do Esterco” ou “Senhor da Residência” [por exemplo, santuário]”.17 Davies diz: “Beelzebub, significava originalmente ‘senhor das moscas’. Mas nessa época significava Satanás, como o senhor da casa dos demônios”.18

5. A garantia (10.26-33) Apesar dessas predições de perseguição, Jesus disse aos seus discípulos que não

tivessem medo. Pois nada há encoberto que não haja de revelar-se (26) - em grego, “descoberto”. Chegará o dia em que tanto os perseguidores quanto os perseguidos serão

vistos sob a sua luz verdadeira. O Dia do Juízo fará o registro correto. Portanto, os discípulos deveriam pregar a mensagem de Cristo corajosa e abertamente (27). Eles não deveriam temer aqueles que podiam matar o corpo, mas somente aquele

que pode fazer perecer no inferno a alma e o corpo (28) - Geena (inferno). A maioria dos comentaristas concorda que a referência aqui é a Deus e não a Satanás.18 Para encorajar a fé dos discípulos, Jesus citou os passarinhos (29). Dois deles eram

vendidos por um ceitil. Aqui há uma palavra grega diferente daquela que é traduzida como “ceitil” em 5.26 (veja o comentário sobre esta passagem). Um ceitil valia aproximadamente um centavo. Embora comercialmente cada pássaro valesse apenas meio centa vo, nenhum deles cairia no chão sem o consentimento do Criador. Somente a eternidade

pode explicar esse conceito .de Deus. As mentes finitas são incapazes. E necessário um “salto de fé” para se crer em um Deus que, na verdade, é infinito em conhecimento e em poder. Para tornar as coisas um pouco mais pessoais, Jesus disse: até mesmo os cabelos

da vossa cabeça estão todos contados (30). Além disso, mais valeis vós do que muitos passarinhos (31). Assim, o sentimento lógico é a confiança, e não o medo. Se os discípulos fossem fiéis em confessar (32) a Cristo pela pregação destemida da

sua verdade (cf. v. 27), e o reconhecessem fielmente como o seu Senhor, a qualquer preço, Ele prometeu que os reconheceria perante o seu Pai. Mas quem quer que o negasse (33) seria negado perante o Pai. O contexto indica que o silêncio - ou seja, deixar de falar a favor de Cristo - pode ser uma maneira de negá-lo.

6. O Preço do Discipulado (10.34-39) A afirmação de Jesus: não vim trazer paz, mas espada (34) é assombrosa - poderíamos dizer, literalmente, “chocante”. E óbvio que Ele está falando dos inevitáveis resultados das exigências do discipulado. Tasker acertadamente observa: “As conseqüências são freqüentemente expressas na Bíblia cõmo se fossem intenções”.20 Sempre será verdade que alguns membros de uma família aceitarão a Cristo, enquanto outros o rejeitarão. Isto traz um conflito inevitável. Pois Deus exige, em primeiro lugar, o nosso amor e a nossa fidelidade (37). Falando em termos terrenos, isto combate a natureza do egoísmo. Aquele que deseja seguir a Cristo deve tomar a sua cruz (38) em completa submissão à vontade de Deus. Uma das frases mais significativas de Jesus está no versículo 39.21 Sobre a primeira

parte, Filson diz: “Buscar a si mesmo é derrotar a si mesmo”.22 Sobre a segunda parte, Davies escreve: “A auto-negação e o auto-sacrifício são os únicos caminhos para o autoconhecimento”.23 No contexto da perseguição descrita nos versículos anteriores, a aplicação especial desta verdade seria: “Aquele que, sob a pressão da perseguição, desejar preservar a sua vida, perderá a verdadeira vida da alma; ao passo que aquele que morrer com alegria, viverá”.24

7. O Privilégio do Discipulado (10.40-42) O relacionamento entre o discípulo e o seu Senhor é, de certo modo, semelhante ao

de Cristo com o seu Pai - aquele que me enviou (40). Somos lembrados da linguagem de Jesus em sua oração sumo-sacerdotal (Jo 17.21-23). Lukyn Williams define profeta (41) como “alguém sobre quem se pode afirmar que

o manto dos antigos profetas, de alguma maneira, caiu”; e justo como “alguém que é meticuloso em cumprir a vontade revelada de Deus em todos os seus detalhes”.25 Profeta e justo são termos usados aqui referindo-se aos discípulos. Até mesmo dar um copo de água fria em nome de discípulo (42) traz uma recompensa. Os discípulos são, desta maneira, honrados como emissários de Cristo. Como indicado pelos títulos, as duas últimas seções deste capítulo nos dão um esboço de sermão de dois tópicos: 1) o preço do discipulado; 2) o privilégio do discipulado.





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